31 July 2016

Sumário Executivo: Acusações, Julgamentos e Condenações em casos de violénsia sexual em Timor-Leste 2012-2015

ETLJB 31 July 2016 Source: JSMP East Timor

Sumário Executivo: Acusações, Julgamentos e Condenações em casos de violénsia sexual em Timor-Leste 2012-2015

A violência sexual é uma questão problemática para raparigas e mulheres em Timor-Leste. Estudos têm mostrado que um grande número de mulheres Timorenses experienciou violência com base no género, incluindo violência sexual, durante a sua vida. Um estudo conduzido em 2015 pela Asian Foundation concluiuque 34 por cento das mulheres Timorenses com idades compreendidas entre os 15 e os 49 experienciou violência sexual ao longo da vida. Quarenta e um por cento experienciou este tipo de violência através de um parceiro íntimo, sendo que 14 por cento das mulheres foram violadas por um parceiro não íntimo.


Apesar destas estatísticas recentes, os casos que envolvem violência sexual apenas representam 9 por cento (9%) dos casos criminais presentes em tribunais. Apesar do actual número de incidentes de violência doméstica acontecidos em Timor-Leste, estes valores demonstram que apenas um pequeno número de casos está ao cuidado dos tribunais.

São diversas as razões pelas quais mulheres e crianças em Timor-Leste nāo reportam casos de violência sexual. Muitos são pressionados pelos seus familiares para resolverem estas questões através do sistema de justiça informal, outros têm medo da estigmatizaçāo, mas também a falta de consciencialização acerca do sistema judicial formal, assim como a a percepção de que a violência que acontece em casa pertence ao foro familiar privado são fortes razões. Quando o sistema legal falha devido à falta de diligênciaem punir os perpetradores e em fornecer a justiça às vítimas, dissuade mais ainda as vítimas a recorrerem o sistema de justiça formal.

Nos últimos anos, os tribunais em Timor-Leste fizeram importantes progressos no que diz respeito aos casos de violência sexual.  Incluindo sentenças mais apropriadas em casos de abuso sexual de menores e indemnizações civis concedidas às vítimas. No entanto, o JSMP observou que a maioria dos casos de violência sexual continuam a ser tratados inadequadamente. Através dos seus programas de motorização dos tribunais em particular, o JSMP observou erros na acusação de perpetradores e sentenças inconsistentes e frequentemente descontextualizadas do crime cometido. O sistema legal também adoptou práticas que falharam na protecção adequada dos direitos das vítimas, incluindo a confidencialidade e segurança.

Ainda que alguns obstáculos acima evidenciados necessitem de tempo e recursos para ser ultrapassados, todos os actores judicias em Timor-Leste podem fazer mudanças imediatas para tornar o sistema legal formal uma zona segura, onde as vítimas de violência sexual podem receber justiça.

Acusaçā
A aplicação incorrecta da lei por parte de membros do Ministério Público, pode corresponder a acusações fracas ou incorrectas, que podem levar a sentenças indulgentes ou, no pior dos casos , à absolvição dos perpetradores. Seleccionar a sentença mais apropriada é importante, mas pode tornar-se difícil em casos de violência sexual devido à variedade de ofensas presentes no Código Penal. O JSMP observou as seguintes falhas:

-     Quando mais de uma infracção se aplica a um crime, procuradores devem seleccionar a mais específica, ampla e mais complexa  disposição, e as provisões principais são sobrepostas a provisões subsidiárias (Artigo 42 do Código Penal). O JSMP observou que este princípio tem sido aplicado incorrectamente em casos de abuso sexual de menores onde é frequente o arguido ser acusado sob o Artigo 172 por violação em vez do Artigo 177(1), que é referente especificamente ao abuso de menores.

-     Actores judiciais, incluindo procuradores e juízes, interpretem e aplicam incorrectamente as disposições do Código Penal no que diz respeito ao agravamento. O JSMP observou três problemas comuns:
1.      procuradores públicos e tribunais falham na identificação da existência de factores agravantes;
2.      tribunais falham em ter em conta, factores relevantes agravantes;
3.      actores judiciais utilizam o artigo errado do Código Penal no que se refere à aplicação de factores agravantes.

-     As provisões  do Código Penal no que diz respeito a violações e outras ofensas sexuais são igualmente aplicadas à violência sexual dentro do casamento assim como de outras relações íntimas. No entanto, a monitorizaçāo de casos por parte do JSMP, mostrou que as acusações de violação no casamento são virtualmente inexistentes.

-     O JSMP observou frequentemente que o Artigo 23 do Código Penal é incorrectamente aplicado em crimes de violência sexual. Em particular, procuradores acusaram com tentativa quando o crime tinha sido efectivamente cometido, particularmente em relação a casos de violação sob o Artigo 172.

Provas e Julgamentos
Casos de violência sexual podem ser difíceis de provar uma vez que podem não existir testemunhas dos eventos assim como evidências físicas. É importante para o procurador e para o tribunal considerar cuidadosamente todas as evidências, mas o JSMP observou momentos onde tribunais consideram que provas nāo sāo relevantes, colocando demasiado peso nessa evidência.

4.      Timor-Leste tem uma provisão acerca da violação com base na força que requer provas de que o perpetrador utilizou violência, ameaças sérias ou que deixou inconsciente a vítima para o propósito de actos sexuais. Na prática, tem sido difícil para as vítimas de provar e até mesmo, quando a violência ou ameaças estão presentes, actores judiciais em Timor-Leste consideram frequentemente a falta de resistência física ou gritos como evidência de consenso.
5.      O JSMP observou que os tribunais consideram a falta de evidência médica como motivo  para absolvição de sentenças ou para a escolha de sentenças mais brandas em casos de violência sexual. Existem muitas razões pelas quais a vítima possa nāo ter obtido um relatório médico, incluindo o medo do estigma, o desconhecimento relativamente ao sistema legal ou ainda a inexperiência da polícia em indicar as facilidades médicas para as vítimas. O tribunal deve estar disposto a julgar com base em evidências que comprovem os crimes.
6.      Tribunais deduziram, a partir do atraso da vítima em reportar a violação, que a relação sexual foi consentida ou que não ocorreu. É frequente as vítimas atrasarem a queixa por diversas razões legítimas, incluindo humilhação e falta de acesso à polícia. As melhores práticas internacionais recomendam que os tribunais não apresentem nenhuma conclusão desfavorável devido a qualquer tipo de atraso na notificação.
7.      Em Timor-Leste, as vítimas de violência sexual são frequentemente forçadas a estar em contacto com o perpetrador durante o julgamento, incluindo ter de esperar na mesma sala assim como deslocar-se para o tribunal no mesmo veículo. As vítimas, incluindo crianças, apresentam os relatos na sala de tribunal em frente ao perpetrador, sendo que nenhum esforço para evitar o contacto entre ambos, é feito.
8.      A privacidade das vítimas é um problema em diversos casos de violência sexual. Os tribunais imprimem os nomes completos de ambos vítima e perpetrador expondo-os no horário do tribunal e no passado, alguns tribunais móveis permitiram que membros do público observassem os julgamentos e que tirarem fotografias. Estas práticas podem causar humilhação e representar um risco sério para as vítimas.

Condenaçāo
Existem frequentemente, numerosas circunstâncias agravantes e atenuantes em que o tribunal deve considerar aquando da acusação, o cálculo das penalidades de maneira metodológica pode ser difícil. O JSMP observou que a condenação em crimes de violência sexual pode frequentementeser inconsistente e desproporcional com a acusação.

1.      Quando penas suspensas sāo aplicadas, os tribunais não fornecem as razões para a suspensão tal como requerido no Artigo 68 do Código Penal e, não aplicam nenhuma outra condição ou ordem por como exemplo requerer que o perpetrador faça um pedido de desculpas público (Artigo 69(2)(b)) ou ainda, requerer a sua monitorização tal como a sua adesão a um plano de reintegração social (Artigo 71).
2.      Sentenças têm sido consideravelmente reduzidas como resultado da atenuação das circunstâncias que não deviam ter sido tidas em conta, ou aplicadas ate esse nível. Isto inclui a ocupação ou profissão do arguido, se ê ou não respeitado(a) na comunidade e outros assuntos relacionados com a sua posição social. Estes factores não podem ser vistos como motivo de atenuação que diminuem a culpa do perpetrador.
3.      É comum para tribunais em Timor-Leste que se tenha em conta a mediação informal entre as famílias do arguido e da vitima aquando da sentença. Os tribunais devem considerar as circunstâncias de cada caso e de cada vítima e se a vitima estava envolvida na mediação e se recebeu a restituição.
4.      Desde 2012, compensações apenas foram dadas em 17 casos de violência sexual monitorizados pelo JSMP. As compensações devem ser utilizadas de forma mais efectiva pelos tribunais uma vez que podem fornecer uma reparação para a vítima e pode cobrir custos financeiros associados com o crime.

Com base nas evidências apresentadas neste relatório, o JSMP faz as seguintes recomendações para melhorar os processos dejulgamento e condenação em casos de violência sexual, assim como melhorar o tratamento das vítimas durante os processos. Estas alterações pretendem melhorar a protecção assim como trazer justiça para as vítimas.

Recomendações

1.      Os procuradores públicos devem considerar cuidadosamente as provas em cada caso e, de acordo com o Artigo 42 do Código Penal, devem seleccionar a acusação mais adequada e a que fornece a pena mais séria disponível. Particularmente, aquando da acusação de de crimes sexuais contra menores, procuradores devem utilizar o Artigo 177(1) (abuso sexual com penetraçāo e 177(2) (abuso sexual sem penetraçāo), uma vez que estas disposições reconhecem a gravidade da violência sexual contra crianças aplicando sentenças mais pesadas e encargos mais leves em termos de provas.

2.      Os procuradores públicos devem identificar e aplicar artigos apropriados de agravante para a acusação inicial, incluindo circunstancias especificas agravantes (Penal Code Articles 173 e 182) e factores agravantes gerais (Artigo 52). Quando mais de uma circunstancia agravante está presente, os tribunais devem aplicar a máxima sentença de acordo com a amplitude da relevância da sentença.

3.      Os procuradores públicos devem reconhecer que violência sexual dentro do casamento ou de uma relação íntima é um crime e deve ser punido utilizando o crime aplicável no Código Penal. A acusação de violência sexual dentro do casamento deve sempre ser entendida como uma ofensa agravada devido à relação familiar (Artigo 173(a), ou Artigo 182 (d)). Violência sexual dentro de um casamento também é uma circunstância de agravamento geral sob o Artigo (52(2)(I) e merece uma pena mais grave dentro do alcance mínimo e máximo dessa ofensa.

4.      O serviço do Ministério Público deveria desenvolver directrizes legais em acusações de crimes envolvendo violência sexual. As directrizes legais devem clarificar as questões identificadas nas Recomendações 1-3.

5.      O procurador público deve reconhecer que violação sob o Artigo 172 do Código Penal inclui sexo vaginal, oral ou anal, incluindo a utilização de objectos, e proceder a uma acusação apropriada. Em casos de violação, procuradores públicos e tribunais naāo devem requerer provas de danos físicos quando considerando se a vítima foi forçada ou ameaçada, e inexistência de resistência nunca devem ser considerados uma prova de consentimento em casos de violação.

6.      Os tribunais nāo podem aceitar a falta de provas médicas de danos físicos causados por alegada violência como prova conclusiva que agressão sexual. Os procuradores devem ser capazes de estabelecer um caso baseado no testemunho da vitima e outras provas, mesmo que não haja evidência médica que mostre ferimentos devido à agressão sexual. O tribunal deve olhar para outras evidencias apresentadas pelo procurador e inconsistências nos argumentos do arguido.

7.      Através do Ministério da Saúde e do Centro de Formação Judicial (CFJ), o Governo deve fornecer fontes suficientes para que actores judiciais recebam formação acerca do uso de provas médicas, incluindo o Protocolo Forense Médico.

8.      Os tribunais devem utilizar provisões existentes no Código de Processo Penal para minimizar o contacto entre vítimas e arguidos durante julgamentos, particularmente em casos de abuso sexual de crianças. De acordo com o Código de Processo Penal, os casos envolvendo agressões sexuais com menores, os tribunais devem em regra geral fechar o caso ao público. Em casos caracterizados como violência sexual contra um adulto, o tribunal deve considerar fechar o caso ao público de forma a preservar a dignidade humana da vítima.

9.      Aquando da condenação, os tribunais devem aderir às seguintes directrizes:
a)      Quando identificados factores atenuantes, os tribunais devem mostrar que a circunstancia reduziu a culpabilidade do perpetrador e a necessidade de castigo. As características pessoais do acusado, tal como a idade ou o estatuto social não reduzem a culpabilidade do acusado ou da necessidade de castigo e não devem ser consideradas circunstancias atenuantes.
b)      Quando o perpetrador fornece restituição sob lei do costume, os tribunais devem considerar os factos de cada caso para determinar se essa restituição foi efectivamente dirigida à vitima ou à família da vítima.
c)      Em todos os casos de violência sexual os tribunais devem considerar exigir a pessoa acusada o pagamento de um compensação à vítima como forma de reconhecimento e reparação o sofrimento vivenciado.
d)      De acordo com o Artigo 68(2) do Código Penal, os tribunais devem fornecer fundamentos para a sua decisão em aplicar pena suspensa e quando proferida, os tribunais devem aplicar ordens adicionais, particularmente para prevenir o contacto entre perpetrador e vítima.

10.  As normas de condenação devem ser desenvolvidas para assegurar a coerência dos resultados de condenação. Estas orientações devem delinear claramente os princípios de condenação gerais, fatores agravantes e atenuantes usando exemplos, regras para reincidentes, orientação sobre penas alternativas e fornecer para o cálculo da compensação civil.

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Para mais informações, contacte:

Luis de Oliveira Sampaio
Director executivo JSMP
E-mail: luís@jsmp.minihub.org
Telefone: 3323883 |77295795

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